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08
dez
2025
(MEIO AMBIENTE)
Transformar desertos em florestas sem plantar uma única árvore

Transforma desertos em florestas sem plantar uma única árvore enquanto bilhões investidos falham, menos de 20 por cento das mudas sobrevivem e a Tanzânia recupera 500 mil hectares usando raízes antigas escondidas no solo

Na Tanzânia, desertos em florestas sem plantar uma única árvore com floresta subterrânea, regeneração natural e agricultura regenerativa. Imagem: Mundo Discovery

Bilhões em mudas deram errado, mas a Tanzânia descobriu uma “floresta subterrânea” e usa raízes antigas para transformar desertos em florestas sem plantar uma única árvore

Bilhões de dólares já foram investidos em campanhas de reflorestamento na África. Milhões de mudas foram plantadas, mas em muitos lugares o resultado foi praticamente zero. Em regiões extremamente secas, como partes da Tanzânia, a taxa de sobrevivência das árvores mal chegava a 20 por cento. Mesmo com bons slogans e promessas grandiosas, as plantações morriam poucos meses depois. É nesse contexto de frustração que surge uma ideia radical: transformar desertos em florestas sem plantar uma única árvore, usando o que já está escondido debaixo da terra.

Em vez de insistir em novas mudas vulneráveis, agricultores e técnicos passaram a olhar para o solo de outra forma. Logo abaixo da superfície, existe uma espécie de floresta subterrânea, feita de raízes e troncos antigos ainda vivos, esperando uma oportunidade para rebroçar.

A partir dessa descoberta, a Tanzânia adotou uma técnica de regeneração que permite transformar áreas degradadas em mata densa, reduzindo custos, aumentando a produtividade e oferecendo um caminho real de recuperação ambiental.

O fracasso dos plantios em massa na África

Durante anos, a resposta mais comum à degradação ambiental foi plantar mudas em grandes campanhas. O raciocínio parecia simples: quanto mais árvores forem plantadas, melhor. Na prática, porém, a realidade dos agricultores africanos era outra. Em lugares como Dodoma, no centro da Tanzânia, o solo é duro, o sol é intenso e a água é escassa.

Plantava-se uma muda frágil em um ambiente hostil, que exigia regas constantes, sombreamento e cuidados diários.

Para quem precisa caminhar muitos quilômetros por dia apenas para buscar água para a própria família, gastar esse recurso limitadíssimo em centenas de mudas era simplesmente inviável. Caminhões cheios de plantas chegavam, fotos eram tiradas, os técnicos iam embora e, poucos meses depois, o que restava eram galhos secos.

Além disso, práticas tradicionais reforçavam o problema. Muitos agricultores acreditavam que um campo “limpo” era um campo sem árvores, apenas com a cultura principal.

Tudo o que brotava era cortado ou queimado para preparar o solo. Sem perceber, os próprios moradores destruíam a camada de proteção que poderia manter a umidade, segurar os nutrientes e evitar o endurecimento do solo. O deserto avançava, a produtividade caía e o ciclo de pobreza e degradação parecia sem saída.

A descoberta da floresta subterrânea

A mudança de rota começa com uma observação simples, feita originalmente em outra região africana, mas que se tornaria crucial para a Tanzânia. Ao atravessar uma área aparentemente vazia, um agrônomo reparou em um arbusto que todos tratavam como erva daninha.

Ao olhar com atenção, percebeu que aquele pequeno broto não era uma planta qualquer: era o rebento de um tronco subterrâneo de uma árvore antiga, que continuava viva debaixo da terra.

Em muitos locais, árvores nativas foram cortadas ao longo das décadas, mas suas raízes permaneceram. Adaptadas a climas extremos, essas espécies desenvolveram sistemas radiculares profundos, capazes de buscar água a grandes profundidades e armazenar energia por anos.

O que parecia apenas um arbusto ralo era, na verdade, a ponta visível de uma floresta subterrânea pronta para voltar a crescer.

Essa percepção muda tudo. Em vez de gastar recursos trazendo novas mudas frágeis, a ideia passa a ser aproveitar a regeneração natural das árvores que já estavam ali, usando a força das raízes antigas. A técnica ganha o nome de FMNR, regeneração natural gerida por agricultores, e na Tanzânia é conhecida como “Kisiki Hai”, expressão que pode ser traduzida como “tronco vivo”.

Como funciona a regeneração natural gerida por agricultores

O princípio da regeneração natural é simples: em vez de arrancar os arbustos que surgem no campo, o agricultor passa a selecioná-los, podá-los e protegê-los para que se tornem árvores novamente. Por trás dessa simplicidade, existe um mecanismo biológico poderoso.

Quando uma árvore é cortada, o tronco desaparece da superfície, mas as raízes continuam armazenando água e nutrientes. Sem manejo, dezenas de brotos fracos surgem ao mesmo tempo, competindo por luz e energia. A planta permanece baixa, parecendo apenas um arbusto.

A técnica de Kisiki Hai faz o oposto do que se fazia antes. O agricultor observa o arbusto, escolhe dois ou três brotos mais fortes e retos, e remove os demais. Com a poda correta, toda a energia acumulada no sistema radicular é direcionada para poucos troncos, que crescem com velocidade impressionante.

O resultado é que uma árvore regenerada a partir desse tronco vivo pode atingir vários metros de altura em pouco tempo, algo que uma muda recém-plantada demoraria anos para conseguir. Não é preciso comprar mudas, nem montar sistema de irrigação caro.

Os custos se reduzem a ferramentas simples e capacitação das famílias rurais. Trata-se de uma forma de agricultura regenerativa de baixo custo, baseada em conhecimento e manejo, não em insumos caros.

Tanzânia: da perda de florestas à recuperação de centenas de milhares de hectares

Até 2025, a pressão das mudanças climáticas sobre a África era enorme, e a Tanzânia perdia quase meio milhão de hectares de florestas por ano. Com a adoção da regeneração natural e do Kisiki Hai, esse movimento começou a mudar.

Mais de 500 mil hectares de áreas antes degradadas foram restaurados em regiões como Dodoma e Singida, com campos antes secos voltando a ficar verdes.

O processo não foi imediato. No início, muitos agricultores desconfiavam da ideia. Havia medo de que a sombra das árvores reduzisse a produção de grãos ou atraísse pássaros que comeriam as sementes. Foi preciso que alguns pioneiros testassem a técnica e mostrassem os resultados na prática.

Com o tempo, comunidades inteiras passaram a experimentar a regeneração natural, apoiadas por organizações locais que levavam informações, treinamentos e até sessões de cinema itinerante para explicar os benefícios.

À medida que os primeiros campos manejados com Kisiki Hai sobreviveram melhor à estação seca, os vizinhos começaram a perceber a diferença. Onde não havia árvores, as lavouras secavam rápido. Onde a regeneração natural era aplicada, o solo mantinha mais umidade, as plantas resistiam melhor e a produtividade aumentava.

Assim, a confiança se espalhou e desertos em florestas sem plantar uma única árvore deixaram de ser apenas uma ideia ousada e passaram a ser uma experiência concreta no cotidiano das aldeias.

Benefícios para solo, água, produtividade e qualidade de vida

Os impactos da regeneração natural vão muito além da paisagem mais verde. A sombra das árvores reduz a temperatura do solo, ajudando a manter a umidade e protegendo as culturas do sol direto.

As folhas que caem formam uma camada de matéria orgânica que devolve nutrientes ao solo, reduzindo a necessidade de fertilizantes comprados.

Com o solo mais poroso graças às raízes, a água da chuva passa a infiltrar em vez de escorrer pela superfície. Isso diminui o risco de enxurradas e aumenta a recarga das reservas subterrâneas.

Poços que antes secavam durante o verão passaram a manter água por mais tempo, o que muda completamente a rotina das famílias.

Há também um efeito direto na qualidade de vida. Antes, mulheres e crianças caminhavam longas distâncias para buscar lenha em áreas cada vez mais distantes. Com as árvores regeneradas perto das casas e lavouras, é possível obter lenha por meio da poda, sem derrubar o tronco. O tempo economizado pode ser usado para estudar, trabalhar ou cuidar da família.

A biodiversidade também reage: aves retornam, trazendo sementes de outras espécies, insetos polinizadores reaparecem e algumas comunidades passam a criar abelhas nas áreas restauradas, gerando nova fonte de renda.

Desertos em florestas sem plantar uma única árvore como resposta ao clima e à economia

À medida que a técnica se espalhou pela África, a regeneração natural passou a ser vista como uma ferramenta importante no enfrentamento das mudanças climáticas. Iniciativas continentais, como projetos que buscam conter o avanço de grandes desertos, passaram a olhar para essa abordagem como um dos pilares para recuperar áreas áridas a baixo custo.

Estudos e estimativas apontam que, se adotada em larga escala em zonas secas, a técnica pode restaurar milhões de hectares de cobertura arbórea e ajudar a absorver grandes quantidades de dióxido de carbono por ano.

Tudo isso sem depender de tecnologias complexas, apenas com o uso inteligente da floresta subterrânea e da agricultura regenerativa praticada pelas comunidades.

Com a popularização dos créditos de carbono em 2025, o impacto ficou ainda mais visível para os agricultores da Tanzânia.

Eles não apenas recuperaram suas terras e passaram a viver em áreas que antes pareciam desertos em florestas sem plantar uma única árvore, como também começaram a gerar renda por preservar essas áreas verdes.

Grandes organizações passaram a remunerar comunidades que mantêm e ampliam a cobertura florestal, tornando a árvore em pé mais valiosa do que derrubada.

A lição da Tanzânia para o mundo

A história da Tanzânia mostra que a solução para alguns dos maiores desafios ambientais do planeta pode estar mais perto do que imaginamos.

Muitas vezes, a humanidade aposta em grandes projetos, máquinas sofisticadas e campanhas impressionantes, sem perceber que a natureza já oferece mecanismos poderosos de regeneração.

A ideia de transformar desertos em florestas sem plantar uma única árvore não é mágica, é o reconhecimento de que o solo guarda memória e energia em suas raízes antigas.

Quando agricultores, técnicos e comunidades passam a enxergar esses troncos vivos como aliados, toda a lógica de manejo muda. Em vez de lutar contra a natureza, o ser humano passa a trabalhar com ela.

No fim, a mensagem central é simples: antes de tentar impor soluções de fora, vale a pena olhar para o que já existe debaixo dos nossos pés. Em muitos lugares, a vida não precisa ser importada em caminhões de mudas, ela precisa apenas ser despertada.

Escrito porCarla Teles

https://clickpetroleoegas.com.br/transforma-desertos-em-florestas-sem-plantar-uma-unica-arvore-enquanto-bilhoes-investidos-falham-menos-de-20-das-mudas-sobrevivem-e-a-tanzania-recupera-500-mil-hectares-ctl01/

Fonte: https://clickpetroleoegas.com.br

ITTO Sindimadeira_rs

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