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O Brasil tem um ativo ambiental invisível, uma das maiores formações naturais de bambu do mundo, no Acre e Amazonas, e tem uma tarefa enorme: manter essa floresta em pé. Às vésperas da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP 30), marcada para novembro de 2025, em Belém (PA), o Le Monde Diplomatique Brasil conversou com Alejandro Luiz Pereira da Silva, homem que ama os bambus.
Arquiteto formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, ele dedicou a vida profissional ao planejamento urbano, regional, setorial e estratégico. Trabalhou em Maceió, Belém, Teresina, Recife, Fernando de Noronha, Brasília e Palmas e concebeu e dirigiu o Instituto do Bambu para o Sebrae.
Por que o bambu é considerado ativo ambiental estratégico para o Brasil?
O Brasil tem uma das maiores formações naturais de bambu do mundo, no Acre e Amazonas. São 90 mil km² no Brasil, mais 90 mil km² no Peru. É ativo invisível, mas com potencial enorme para descarbonização, transição energética e geração de renda sustentável. Será necessário ativar essa oferta ambiental hoje invisível. Precisamos valorizar o impacto ambiental positivo a curto prazo na descarbonização e na transição energética que o manejo adequado do bambu pode proporcionar.
Como o bambu pode contribuir para o combate às mudanças climáticas?
Quando manejado corretamente, o bambu pode aumentar a absorção de carbono em 30%, se comparado às condições naturais. Se transformarmos sua biomassa em biochar – um material poroso rico em carbono – e o incorporarmos ao solo, o efeito de descarbonização é aumentado. Além disso, pode ser gaseificado e substituir o diesel em geração de energia.
Poderia explicar o que é biochar?
O biochar é produzido pelo aquecimento de biomassa com oxigênio controlado. Quando adicionado ao solo, fixa o carbono na terra por centenas de anos e obtém a maior remuneração pelos créditos de carbono. Além disso, melhora a fertilidade do solo e beneficia a agricultura orgânica. É ganho ambiental e produtivo.
Por que o bambu é tão importante para o meio ambiente?
O bambu cumpre distintas funções em diferentes ambientes. O homem tradicionalmente o utiliza como alimento e seus brotos fazem parte da política de segurança alimentar de vários países.O bambu serve para conter encostas, erosão e assoreamento de cursos d´água de superfície. Pode, ainda, controlar a poluição de superfície, tratar esgotos e recuperar solos contaminados, além de proteger e recuperar de nascentes. A lista é longa: ajuda na regeneração de florestas degradadas, na proteção e recuperação da fertilidade de solos, na proteção de áreas sujeitas a enchentes e na formação de barreiras de ventos e acústicas. Na relação resistência mecânica/peso específico, ele supera o aço.
Qual é o potencial energético do bambu?
O bambu pode ter produtividade superior à cana-de-açúcar na produção de etanol. Seu poder calorífico é similar ou superior ao de muitas árvores. Pode ser transformado em biocombustível para comunidades ribeirinhas, substituindo combustíveis fósseis.
O bambu já está inserido no mercado de créditos de carbono?
A EcoPlanet Bamboo, dos EUA, foi pioneira em 2013 com metodologia verificada. Tem projetos na Nicarágua, Gana, Ruanda, África do Sul e Filipinas. Vão remover mais de 12 milhões de toneladas de carbono em vinte anos. A sueca PlanBoo Eco também inovou com metodologia simplificada no Sri Lanka. Ela arregimenta agricultores para produzir bambu de forma adequada aos parâmetros pré-estabelecidos e a produzir o biochar em fornos simples, mas capazes de contabilizar os dados de produção. Então, converte a produção em créditos de CO2 equivalentes. Todos ganham: agricultores e empresa, que recebe comissão pela comercialização dos créditos de carbono.
Quais os maiores desafios para desenvolver essa cadeia no Brasil?
Trabalhar no bioma amazônico é complexo: questões de sanidade, logística, falta de conhecimento técnico e apoio. Precisamos de ação conjunta do setor público, empresarial e da sociedade civil. A participação internacional, como a do International Bamboo and Rattan Organization (Inbar), e um projeto binacional com o Peru seriam muito úteis.
O que falta ao Brasil para transformar essa vantagem natural em competitiva?
Todos os países que desenvolveram a economia do bambu começaram pelas formações naturais. Temos uma vantagem comparativa internacional. Transformá-la em vantagem competitiva exigiria investimento em pesquisa, desenvolvimento tecnológico e políticas públicas adequadas.
Suas considerações apontam para a importância da incorporação de novos conhecimentos, de inovação e pioneirismo.
O bambu representa oportunidade única para o Brasil liderar a transição ecológica. Cabe a nós – poder público, setor privado e sociedade civil – transformar essa vantagem natural em prosperidade sustentável.
Rodrigo Farhat
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Entrevista produzida como conclusão do curso “Divulgação científica para comunicadores e jornalistas”, baseada na aula de Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da USP, sobre “Sociedade e mudanças climáticas”.
https://diplomatique.org.br/bambu-e-ativo-ambiental-invisivel-na-amazonia/
Fonte: https://diplomatique.org.br
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