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Como as árvores da Amazônia têm reagido ao aumento das emissões de dióxido de carbono nos últimos séculos? É sabido que, entre os gases de efeito estufa, o CO2 é apontado como o principal responsável pelo aquecimento global. O mais recente relatório divulgado pela Organização Meteorológica Mundial(OMM), revelou que a concentração de carbono na atmosfera global teve em 2024 o maior salto anual já registrado desde o início das medições em 1957. Cientistas do clima são unânimes em afirmar que este aumento foi provocado pelas atividades humanas, sobretudo pela queima de combustíveis fósseis, como petróleo, carvão e gás.
Porém, para a surpresa de pesquisadores envolvidos em um novo estudo publicado recentemente na revista Nature Plants, as florestas maduras da Amazônia têm demonstrado uma forte resiliência frente às mudanças climáticas decorrentes do excesso de carbono na atmosfera — isso é relevante porque as árvores são consideradas sumidouros naturais de CO2, pela habilidade de absorvê-lo no processo de fotossíntese. E não só isso: as árvores amazônicas estão ficando mais "gordas", com o tamanho da área de seu tronco aumentando em 3,3% a cada década.
"Normalmente, não esperaríamos que o tamanho médio das árvores em uma área de floresta madura mudasse ao longo do tempo, desde que as taxas de crescimento e morte delas fossem geralmente estáveis", explica Rebecca Banbury Morgan, pesquisadora da Escola de Ciências Biológicas da Universidade de Bristol, no Reino Unido, e coautora do artigo.
"Comparamos nossas observações com essa expectativa de ausência de mudança e descobrimos que o tamanho médio estava aumentando. Isso indica que, atualmente, as árvores estão crescendo mais rápido do que morrendo, o que provavelmente se deve ao aumento do dióxido de carbono atmosférico."
O estudo, que envolveu um grupo de quase cem cientistas de mais de 60 universidades e instituições de pesquisa de diversos países, incluindo o Brasil, comparou medidas dos últimos 30 anos, documentadas pela Amazon Forest Inventory Network (Rainfor), rede internacional de profissionais que estudam a Amazônia.
"Estudamos 188 pontos situados em todos os países amazônicos. Essa ampla distribuição nos ofereceu uma visão de quão prevalente é esse fenômeno observado na Amazônia como um todo", destaca Adriane Esquivel-Muelbert, pesquisadora da Universidade de Cambridge, que divide a autoria principal do estudo com Rebecca.
Árvores maiores e em maior número
Em cada uma das áreas analisadas, pesquisadores, técnicos e voluntários mediram a chamada área basal — uma seção transversal de seu tronco — de entre 500 e 600 árvores, em um período de dois a cinco anos. A medição é feita a uma altura de 1,5 metro, aproximadamente, e em indivíduos com mais de 10 centímetros de diâmetro. Em geral, são espécies como sumaúmas, angelins ou castanheiras, encontradas com maior frequência nas chamadas florestas maduras — florestas de pelo menos 300 anos, que não sofreram distúrbios ou intervenções humanas.
"Olhar para os tamanhos das árvores nos ajuda a entender quais são as forças agindo na floresta. Desde o final da década de 1990 e começo dos anos 2000 sabemos que a Amazônia está funcionando como um sumidouro de carbono", diz Adriane.
"Sabemos que existe um aumento da mortalidade de árvores em algumas regiões da Amazônia, mas ao mesmo tempo ela não está sendo grande o suficiente para que, na média, a floresta esteja diminuindo de tamanho. Todavia, sabemos também que o CO2 na atmosfera provoca o aumento das secas e da temperatura, mudando o clima, então há esses dois eventos contrastantes agindo sobre a floresta."-
O estudo mostrou que além de estarem ficando maiores, há um aumento no número de árvores. "Essas mudanças significam que a quantidade total de biomassa e carbono armazenada pela floresta também cresceu", aponta a pesquisadora.
Entretanto, mesmo as florestas maduras não estão protegidas das ações humanas e do impacto da crise climática. O relatório Global Forest Watch, divulgado em maio de 2025, pelo World Resources Institute (WRI), revelou uma perda recorde de florestas tropicais primárias no mundo no ano anterior, o pior resultado em duas décadas. E o Brasil, que abriga o maior volume dessas florestas do que qualquer outro país, representou 42% de toda a perda.
A cientista climática Luciana Gatti, coordenadora do Laboratório de Gases de Efeito Estufa do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que não esteve envolvida no estudo, ressalta ainda que a região da Amazônia onde está a maioria dos pontos analisados pelo novo estudo é mais preservada e tem uma redução menor de temperatura e precipitação.Segundo a especialista, na região sudeste da Amazônia, análises demonstram que a floresta já apresenta uma porcentagem na emissão de CO2 cada vez maior. "Em 2018, a emissão era em torno de 30%, agora está batendo 48%, porque o estresse climático lá está aumentando.".
Boas notícias, mas não se sabe por quanto tempo
A descoberta de que as árvores amazônicas estão ficando mais "robustas" só foi possível graças ao trabalho continuado. A brasileira Adriane Esquivel-Muelbert destaca como é só através do monitoramento constante que se consegue entender as mudanças finas da floresta, ou seja, aquelas que não podem ser vistas remotamente, por imagens de satélite.
"Centenas de pesquisadores trabalham há muitos anos para coletar esses dados, em lugares que muitas vezes são remotos e de difícil acesso. É muito importante ressaltar a importância dessa ciência contínua, de longa duração, e de pesquisadores que ganham pouca visibilidade, mas são tão fundamentais para obtermos esses dados tão relevantes para o nosso entendimento da Amazônia."
Mesmo que a resiliência da floresta seja uma boa notícia, não há como afirmar por quanto tempo ela permanecerá assim.
"Em algum momento essa balança pode virar, quando as secas ficarem mais drásticas, por exemplo, mas por enquanto a floresta está se mantendo resiliente, conseguindo responder à maior quantidade de CO2 com o aumento de tamanho", diz Adriane.
"Nossos resultados não significam que a Amazônia não esteja ameaçada pelas mudanças climáticas. Não sabemos como ela responderá a mais mudanças no futuro, nem se a floresta apresentará o mesmo crescimento positivo à medida que o clima continua a aquecer e a seca e os eventos climáticos extremos se tornam mais comuns. Será muito importante continuar monitorando essas florestas no futuro", acrescenta Rebecca.
As principais autoras do estudo reforçam ainda como é fundamental proteger essas árvores maduras — ao combater o desmatamento e a fragmentação da floresta —, para que elas continuem de pé e cumprindo sua função valiosa na regulação do clima da Terra..
"Não podemos simplesmente plantar novas árvores e esperar que elas proporcionem benefícios de carbono ou biodiversidade semelhantes aos que a antiga floresta natural oferece", finaliza Rebecca.
Por Suzana Camargo
*Notícias da Floresta é uma coluna que traz reportagens sobre sustentabilidade e meio ambiente produzidas pela agência de notícias Mongabay, publicadas semanalmente em Ecoa. Esta reportagem foi originalmente publicada no site da Mongabay Brasil… -
Fonte: https://www.uol.com.br
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