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Notícias

15
fev
2019
(CONSTRUÇÃO CIVIL)
Casas passivas: baixo ou nulo consumo de energia, conforto térmico e ganho sustentável

Neste modelo de imóvel, não basta a redução no uso de energia elétrica ou de água; são necessárias diversas ações para alcançar um alto nível de sustentabilidade

A Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte (FIERN) anunciou que construiu a primeira Casa Passiva da América Latina com certificação pelo Passive House Institute, da Alemanha. A inauguração ocorreu em julho do ano passado, por meio de uma parceria da federação com o governo alemão. Trata-se de uma residência modelo, de 80 metros quadrados de área construída, que será utilizada como showroom, laboratório e ambiente para cursos de qualificação do Senai do Rio Grande do Norte.

A chamada Casa Passiva é um modelo de construção sustentável, baseado no consumo nulo ou baixo de energia, aliando um alto conforto interior, por meio de tecnologias empregadas no imóvel. A Alemanha é um dos destaques nesta área, tanto que por lá foi criado o Passive House Institute para certificação de imóveis construídos neste padrão. No entanto, o conceito das passivhaus (casas passivas, em alemão) não ficou concentrado apenas no país e se espalhou por todo o mundo.

Conforme divulgação da FIERN, o modelo permite uma redução de até 75% do consumo de energia e a casa dispõe de um sistema de troca de ar, que possibilita o controle de temperatura e umidade em seu interior, levando mais conforto para os usuários. A casa foi construída com um tijolo leve, maciço e com isolamento térmico e acústico. Segundo a federação, este material ainda deve ser certificado.

Casa Passiva certificada pela Passive House Institute (Foto: Divulgação / FIERN)

No Brasil, o modelo de “passividade” vem sendo empregado em algumas construções há anos, mesmo sem a certificação do instituto alemão. É o caso do Escritório Verde da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), construído em 2011 em Curitiba (PR) e que recebeu diversos prêmios nacionais e internacionais.

O imóvel tem geração própria de energia fotovoltaica e não a consome totalmente com as atividades atuais, repassando o excedente para outro edifício da universidade; conta com isolamento térmico, janelas especiais, telhado verde, arquitetura bioclimática e ventilação cruzada. A estrutura foi construída no sistema wood frame.

Escritório Verde da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (Foto: Divulgação / Eloy Casagrande Junior / UTFPR)

O professor Eloy Casagrande Junior, coordenador do Escritório Verde, conta que a motivação do projeto foi ter uma construção “carbono zero” na cidade. Na época, foram empregadas todas as tecnologias disponíveis no mercado, por meio de parcerias com mais de 50 empresas, além de diferentes níveis do poder público.

“Todo o processo foi avaliado por meio de mestrados e doutorados. Temos dados científicos comprovando a eficiência e os ganhos econômicos relacionados. Neste sentido, o Escritório Verde foi um dos primeiros do Brasil a ter implantado este modelo na construção e a ter dados técnicos científicos acompanhando todas as tecnologias. Isto valida o projeto como pioneiro”, salienta.

O Escritório Verde possui geração de energia fotovoltaica e foi o primeiro imóvel no Paraná a ser conectado na rede de energia, quando ainda não existia legislação sobre o assunto. São 2.100 W instalados e a geração alcança uma média de 200 KW/mês. No entanto, o gasto do Escritório Verde chega a metade disso. O excedente é direcionado para um edifício que fica atrás do imóvel.

(Foto: Divulgação / Eloy Casagrande Junior / UTFPR)

“Estudos demonstraram a eficiência do isolamento térmico – uma das principais características da Casa Passiva -, aliada às janelas de isolamento com material de primeira qualidade. Além do teto, com orientação da arquitetura bioclimática, da iluminação natural, ventilação cruzada, da troca de calor nos ambientes”, explica Casagrande Junior.

Outro fator de destaque do Escritório Verde é a sua construção em wood frame, com isolamento térmico feito em manta de pet reciclável. “Por que optamos pela madeira? Porque a madeira é o único material renovável usado na construção civil. Madeira também é um material mais próximo de nós, mais aconchegante, mais humanizado na construção, diferente de uma construção mais fria”, afirma o professor.

Interior do Escritório Verde (Foto: Divulgação / Eloy Casagrande Junior)

“Construímos o Escritório Verde com a premissa de ser uma construção carbono zero. Todos os materiais da construção convencional, da construção úmida, têm uma grande quantidade de energia no seu processamento e uma grande emissão de carbono. Apenas o cimento é responsável por 7% a 10% dos gases do aquecimento global”, enfatiza.

Casagrande Junior classifica o Escritório Verde da UTFPR como um dos principais exemplos de construções passivas do Brasil. “Juntamos aqui todas estas tecnologias: a energia solar, a iluminação natural, a arquitetura bioclimática, o telhado verde, as paredes isoladas, os vidros isolados… Este conjunto de tecnologias e técnicas aplicados que faz com que o escritório se torne 80% passivo. E que sirva de exemplo de incentivo para que se construa desta forma”, declara.

Telhado verde do imóvel (Foto: Divulgação / Eloy Casagrande Junior)

Gasto x investimento

Para o professor, os investimentos feitos para a construção de uma Casa Passiva são “pagos” diante da economia obtida com a redução no gasto de energia e no consumo de água. Ele lembra que, no caso das placas para energia fotovoltaica, os custos para a instalação já caíram bastante, apesar de ainda serem caros. O retorno do investimento chega a sete anos.

Os clientes podem até procurar projetos nesta área visando as reduções nos gastos, mas já têm um olhar mais sustentável. Ou seja, já enxergam tudo como investimento, em diferentes aspectos. Quem garante é a professora Libia Patricia Peralta Agudelo, também responsável pelo escritório coletivo Ecostudio Soluções Sustentáveis, de Curitiba (PR).

De acordo com ela, com o avanço das tecnologias nos últimos anos, se torna cada mais acessível “ser sustentável” e conseguir arcar com os investimentos para isso, o que abrange os clientes residenciais. Isso acontece pela queda nos custos e também pelo entendimento do cliente sobre a tecnologia embutida na construção.

“No momento em que entra o conceito da tecnologia, a pessoa entende que não será necessariamente barata. Mas a tecnologia evoluiu de uma certa forma que o investimento não é muito maior. Estamos falando de 2% a 3% a mais, dependendo da sofisticação ou do tipo do empreendimento, mas compensa”, afirma Patricia. Essa proporção pode aumentar para outros tipos de imóveis, como hospitais e edifícios.

Professores Eloy Casagrande Junior e Libia Patricia Peralta Agudelo em frente ao Escritório Verde da UTFPR (Foto: Joyce Carvalho)

Redução x passividade

A Casa Passiva seria o conceito máximo a ser atingido, mas nem sempre é o que acontece na “vida real”. Tudo depende do orçamento do cliente e o tipo de construção, entre outros contextos. “Uma Casa Passiva não é só uma aglomeração de materiais. Cada situação é uma situação, dependendo se é para um escritório, para uma residência, para uma determinada dinâmica familiar. Quando a gente consegue aliar um bom projeto, um bom entendimento de projeto, com uma boa escolha de materiais e tecnologias, aí sim podemos ter uma casa eficiente, sustentável e até mesmo chegar a uma Casa Passiva, que seria o ‘sonho’”, avalia Patricia.

Para a professora, isso depende do entendimento de diferentes variáveis, como condições sociais, contextos climáticos e até mesmo as tecnologias disponíveis, para oferecer a solução que seja viável para o cliente. “Às vezes, não se atinge 100% de passividade, mas a casa é mais eficiente, atingindo uma redução do consumo energético de 30% a 40%, por exemplo, o que ainda é muito bom”, considera.

Casas Passivas – ou pelo menos as com altos níveis de eficiência – não precisam ser apenas construções novas. Patrícia conta que as maiores demandas de trabalho que recebe são justamente para a adaptação de imóveis. “É possível fazer isso, talvez não em todas as construções, especialmente naquelas muito deterioradas ou muito antigas. Mas na maior parte dos casos é possível melhorar muito e tem funcionado”, relata.

Medição da geração de energia fotovoltaica no Escritório Verde da UTFPR (Foto: Jader Rocha / SMCS / Arquivo)

Segundo Patricia, se as tecnologias relacionadas à eficiência energética e à sustentabilidade continuarem neste ritmo de evolução, será viável o Brasil atingir um bom nível de passividade nas construções em poucos anos. No entanto, no entendimento da professora, tudo ainda está muito concentrado em um mercado de residências de alto padrão ou no segmento corporativo.

Para ela, são importantes o investimento e o favorecimento de políticas públicas, que poderiam, por exemplo, reduzir ainda mais os custos de painéis fotovoltaicos. Esta e outras medidas estimulariam a adoção de projetos nesta área para habitações populares.

Curso

Estes temas são abordados no Curso de Especialização em Construções Sustentáveis (Cecons) da UTFPR, cujas inscrições estão abertas até o dia 08 de março. As aulas terão início em 08 de abril. A capacitação é uma das pioneiras nesta área e já formou mais de 180 profissionais. Mais informações neste link.

Fonte: Por Joyce Carvalho para o Portal Madeira e Construção

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