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Notícias

29
ago
2012
(BIOENERGIA)
Agregando valor à biomassa energética - O exemplo finlandês
As primeiras caldeiras Tomlinson de licor negro entraram em operação na década de 1930, o que ajudou fábricas de celulose a reduzirem custos com a recuperação de químicos e, ao mesmo tempo, aumentarem a eficiência energética. Hoje, com leis ambientais mais severas e instabilidades no preço do petróleo, a demanda por sistemas sustentáveis continua crescendo. Se antes o licor negro era definido como um sub-produto do processo de polpação kraft, hoje é visto também como uma fonte indispensável e eficiente de bioenergia. O mesmo conceito pode ser aplicado aos resíduos de madeira, que são tipicamente incinerados para produção de vapor. Processos alternativos como precipitação de lignina, gaseificação, pirólise rápida ou torrefação de biomassa, apesar de não serem inovadores do ponto de vista científico, vêm se tornando cada vez mais viáveis. Vejamos alguns exemplos de projetos recentes que levam a um maior aproveitamento da biomassa.

Gaseificação de resíduo de madeira, Joutseno: Nos anos 80, a crise do petróleo viabilizou a instalação de gaseificadores de biomassa para produzir um combustível alternativo em algumas fábricas de celulose. A primeira unidade, com conceito CBF (leito fluidizado circulante), foi fornecida em 1983 pela Ahlstrom Pyroflow (hoje Foster Wheeler) para substituir o combustível fóssil no forno de cal de Wisaforest, Finlândia. Em seguida, na mesma década, tecnologias similares foram instaladas em duas fábricas na Suécia (Norrsundet Bruks AB e ASSI Karlsborg) e uma em Portugal (Portucel, Rodao). Por incentivos à biomassa, um gaseificador Götaverken (hoje Metso) funciona desde 1987 na fábrica Södra Cell Värö, Suécia. Mais recentemente, a fábrica da Metsä Fibre (antes Metsä Botnia) em Joutseno, Finlândia, colocou em operação um gaseificador para substituir 100% do gás natural no forno de cal. A planta foi fornecida pela Andritz/Carbona e tem uma capacidade instalada de 48MWth. O processo utiliza resíduos florestais e industriais como casca e lascas de madeira, que são secados antes da gaseificação.

Pirólise e produção de bio-óleo, Joensuu: A produção de bio-óleo é uma alternativa interessante pra converter biomassa em líquido. O rendimento (bio-óleo/biomassa seca) pode variar de 55 a 75% (peso) e depende muito da espécie/parte da biomassa e condições do processo. Por exemplo, como as reações de pirólise podem ser catalisadas por sais de metais alcalinos, o rendimento pode ser negativamente afetado. Ou seja, a produção de bio-óleo poderia ser menor se resíduos agrícolas (palha de arroz, milho, trigo, etc) fossem utilizados ao invés de resíduos florestais. Algumas desvantagens do bio-óleo cru em relação ao óleo combustível comum são a presença de água e o poder calorífico até duas vezes menor. A Metso, VTT e UPM têm estudado combustão integrada com pirólise desde 2007. E em 2009, a Fortum se uniu ao projeto pra colocar uma planta de demonstração em prática (start-up previsto pra 2013), conectada a uma termoelétrica na cidade de Joensuu. A capacidade esperada é de 30MW, com produção de 50 mil t/a de bio-óleo, que poderia ser utilizada para substituir combustíveis fósseis em caldeiras existentes. Como matérias-primas, serão utilizados resíduos florestais e outros tipos de biomassa. Futuramente, o bio-óleo poderia ser utilizado para produção de biocombustíveis como querosene, metano, diesel e até combustível de aviação.

Bio-diesel a partir de tall-oil, Kaukas: O tall oil bruto (CTO) é o produto acidificado do sabão e um importante sub-produto da polpação de coníferas. O rendimento depende muito da parte/espécie/estocagem da madeira, temporada, qualidade do solo, etc. Em condições alcalinas, ácidos graxos e resinosos de sais de sódio são formados através da saponificação e se tornam parcilamente solúveis em licor negro. O sabão pode ser separado do licor e convertido em CTO através de um processo de acidulação. Separar sabão do licor negro é importante para evitar distúrbios nos evaporadores e também na qualidade das fibras. O tall oil resultante pode ser utilizado como combustível auxiliar ou vendido para empresas que produzem, por exemplo, detergente, lubrificantes, verniz, etc. Devido à presença de ácidos graxos, também é possível produzir biodiesel de segunda geração. Essa é a aposta do grupo finlandês UPM Kymmene, que anunciou uma planta de aproximadamente 100 mil toneladas anuais de biodiesel, integrada à sua fábrica de celulose em Kaukas. O investimento é de aproximadamente 150 milhões de euros e o start-up está previsto para 2014. O produto será utilizado como combustível de transporte.

Remoção de lignina do licor negro: A idéia de separar lignina do licor negro tem início na década de 1940, quando Tomlinson and Tomlinson testaram a carbonação do licor usando gases contendo CO2. Desde então, importante contribuições tem sido feitas para aperfeiçoar o processo. A tecnologia pode ser utlizada não só para “desafogar” a caldeira de recuperação (ou aumentar produção de polpa), mas também para produzir um biocombustível sólido de bom poder calorífico. O método de precipitação da lignina por acidificação, utilizando ácido mineral e CO2, foi aperfeiçoado pela STFI (hoje Innventia) e Universidade de Chalmers e pode atualmente ser comercializada pela Metso (Lignoboost). A porcentagem de remoção de lignina pode ser limitada pela geração de vapor na caldeira de recuperação, pois cerca de 60% do poder calorífico do licor negro é atribuído à lignina. O Ministério da Economia da Finlândia mostrou interesse em oferecer suporte para implantar uma planta de demonstração em uma fábrica de celulose no país. Saindo do papel, o combustível poderia substituir parte do gás natural consumido no forno de cal. Em escala comercial, uma planta foi negociada com uma fábrica da Domtar nos EUA, com start-up previsto pra 2013.

Combustão de pellet pulverizada, Tampere: Uma das vantagens da peletização é a redução nos custos de manuseio, estocagem e transporte de biocombustível sólido. A densidade aparente do pó de serragem, por exemplo, pode aumentar de 150 kg/m3 para 600 kg/m3. Aplicações incluem fornos residenciais/comerciais ou co-combustão em caldeiras a carvão. Uma termoelétrica (CHP), localizada em Tampere (Finlândia), pretende colocar em operação no país a maior planta com tecnologia para queima de pellet pulverizada. O start-up está previsto para fim de 2012 e será utilizada em horas de pico e também para substituir parte do consumo de combustíveis fósseis. A capacidade, como combustível, será de 33MW. Casos como esse trazem oportunidades para países com grande potencial florestal como o Brasil. A companhia Suzano, por exemplo, já mostrou o interesse em investir na produção massiva de pellets utilizando eucalipto de super curta rotação (2-3 anos).

Um processo adicional bastante comentado é a torrefação (uma espécie de carbonização mais rápida) da biomassa antes da peletização, que também existe em escala comercial. O seu grande feito é a “densificação de energia”, porém com uma certa perda de massa (liberação de voláteis e aumento de carbono fixo). O produto ainda fica com uma característica mais hidrofóbica e “quebrável”. Processos entre 220 e 280ºC com duração de 30 min e 2h (ou até mais) podem ser aplicados, apesar de temperaturas mais altas não serem muito adequadas para uma subsequente peletização. Alguns estudos mostram também que o pellet “torrado” se torna mais eficiente para co-combustão em caldeiras a carvão se comparado a um pellet normal.

Estima-se que em uma fábrica moderna de celulose de eucalipto no Brasil, com uma produção instalada de 1.5M ADt/a, aproximadamente 200 mil toneladas anuais de resíduos de madeira (base seca) podem ser gerados. O valor considera as perdas no processo e que toras são descascadas na floresta, entrando na fábrica com casca residual (3% em volume). Se esse resíduo for bem manuseado para fins energéticos, estudos envolvendo a producão de pellets ou bio-óleo poderiam ser feitos, levando em conta que uma caldeira auxiliar não seria necessária. Outra opção seria a pirólise integrada com combustão em caldeiras de leito fluidizado. Além disso, como há um grande excedente de energia elétrica em fábricas modernas, a remoção parcial de lignina também poderia entrar como alternativa. E exemplos de aplicação mostrados nesse texto podem significar um incentivo a mais não só para a indústria de celulose, mas também para o setor químico, siderúrgico, de energia, etc. É certo que a atratividade depende também da política energética do país, mas seria uma pena não olhar para o grande potencial que a biomassa brasileira oferece.

Fonte: Painel Florestal

ITTO Sindimadeira_rs